Biblioteca Comunitária

Amigos da Leitura

Integrante de

Era uma vez… Um sonho biblioteca!

– Senta aqui que vou te contar uma história.

– Eba! Amo histórias! Essa tem heróis e heroínas? Tem final feliz? Amo histórias com final feliz.

– Essa que vou te contar tem tudo isso e mais um pouco.

– Há algum tempo, você ainda nem tinha nascido, mais especificamente no dia 5 de janeiro de 2005, um homem chamado Fábio Rogério criou um grupo de atividades esportivas. As crianças e adolescentes que participavam dessas atividades amavam estar ali, pois era um momento de interação, exercício físico, entre os amigos e se divertir. Quem não gosta, né?

– Eu amo. Na escola mesmo me divirto muito nas aulas de Educação Física. Gosto de correr, jogar futebol e vôlei.

– Está vendo?! Acho que iria adorar estar no meio desse grupo que Fábio criou. Mas tem mais! Com o passar do tempo sentiu a necessidade de trazer mais para esse grupo de jovens e crianças, era preciso não só exercitar o corpo, mas os nossos sonhos, a nossa criatividade e a nossa vontade de conhecimento. Sabe o que ele fez? Começou a levar livros para serem lidos. Com isso juntou as atividades esportivas com as atividades culturais e educacionais.

– Nossa! Garotos e garotas de sorte! Tiveram duas coisas que eu mais amo, praticar algum esporte e ler.

– Que maravilha, né? Realmente eles eram pessoas de muita sorte. Mas deixa eu te contar… Fábio começou a sentir necessidade de se aperfeiçoar, de procurar melhorar as suas atividades, e você sabe, para se aperfeiçoar, tem que estudar e praticar. E uma oportunidade apareceu, um curso de contadores de histórias, no Porto Digital, localizado na cidade do Recife, em Pernambuco. Quem ministrava esse curso era a contadora de histórias Graça Lins. Ao saber da história de resistência comunitária de Fábio Rogério e a sua vontade de transformar vidas por meio do esporte e da leitura, sugeriu que ele criasse um espaço de leitura. Para isso, iniciou-se uma campanha de arrecadação de livros. Foram mais de 200 livros doados em pouco tempo, a grande maioria de livros didáticos, paradidáticos e pouquíssimos livros de literatura.

– Nossa! Que bom que há pessoas que gostam de ajudar. São muitos livros. Ai! Chega começo a ficar feliz, porque eu amo livro.

– Isso mesmo, eram muitos livros, e para guardá-los foi preciso usar o espaço do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Pernambuco, autorizado pela presidente do sindicato, Dulcilene. Com o tempo, outras pessoas começaram a se aproximar e a querer ajudar nas atividades. Uma dessas foi Edilene, que começou a ajudar com as primeiras formações em espaço e acervo. Graças a ela os melhores livros, com as melhores histórias, eram selecionados para leituras com as crianças e adolescentes. O nosso espaço de leitura era uma pequena sala, e as nossas estantes eram cinco portas velhas que ficavam em cima de cavaletes.

– Como é lindo isso! Mesmo com tão pouco se fazia tanto!

– Isso mesmo! Quando sonhamos com algo, quando nos juntamos com pessoas que compactuam com os mesmos sonhos, o pouco se torna algo grande. E foi assim por quatro anos, todas as vezes antes das atividades esportivas abria-se o espaço de leitura, as crianças e adolescentes entravam para pegar livros, ler e receber alguma mediação de leitura. O projeto foi ficando cada vez mais sólido e cada vez mais importante naquele espaço do sindicato, que se começou a pensar em nomes para a futura biblioteca. Para isso, foi mobilizada a comunidade, o espaço deveria ter a identidade da população. Primeiramente a comunidade sugeriu dez nomes, depois esses nomes foram colocados em uma lista para serem votados. Confeccionaram urnas que foram espalhadas na comunidade – uma na igreja, outra na farmácia, uma no supermercado e outra no sindicato. Ao fim da votação, o nome mais votado foi Biblioteca Comunitária Amigos da Leitura.

– Nossa! É a história de minha biblioteca? Desta biblioteca aqui, tia Selma?

– Isso mesmo! Mas espera que ainda estamos no início. Tem ainda mais coisas para te contar. Mesmo com todas as atividades importantes que aconteceram dentro do sindicato, como balé, futebol, leitura e outras atividades culturais, gente grande às vezes não se entende, e os representantes do sindicato começaram a acusar os leitores que frequentavam o espaço de depredação do ambiente. Sendo assim, após muita conversa e tentativas de se manter o local, não conseguindo, Fábio Rogério decidiu sair do sindicato e infelizmente a biblioteca chegou ao fim.

– Não! Não poderiam deixar fechar uma biblioteca.

– Mas calma! Lembra-se do que disse que quando se tem um sonho lutamos por ele? Pois bem, Fábio trouxe todos os livros e estantes para o terraço de sua casa. Foi um dos momentos mais difíceis da biblioteca, pois com a saída do sindicato vieram contas para pagar de energia, manutenção de materiais, material de limpeza etc. Com um espaço pequeno e sem nenhum recurso financeiro, outra oportunidade apareceu. Lá em Olinda, numa rua com ladeira e estreita, um grupo de outros heróis e heroínas se encontrou rotineiramente para estudos e se organizar para a resistência literária, no Centro de Cultura Luiz Freire. Era a Releitura, que nessa época se chamava Rede de Bibliotecas Comunitárias da Região Metropolitana do Recife. O grupo não tinha dinheiro, mas tinha muita força de vontade, principalmente quando apareciam pessoas como Fábio Rogério, pessoas que lutavam pela abertura de mais espaços em que a literatura imperava. Sendo assim, o grupo ofereceu a ajuda na formação e luta pela resistência.

– Além do terraço de sua casa, começou a ser usada a Quadra Poliesportiva do Alto José Bonifácio. Devia-se regressar às origens, reiniciar as atividades de esportes e atividades culturais e educacionais. Fábio voltou a levar livros para a quadra e lia antes das atividades esportivas. Com o tempo, outra oportunidade apareceu e vou te dizer uma coisa, heróis não se fazem somente pela força ou por algum poder sobrenatural, mas principalmente por agarrar as oportunidades e fazer tudo para consegui-las. E foi assim que aconteceu. Em 2009 abriu-se um edital no Funcultura, pelo qual o CCLF ajudou na sua construção, e o Projeto Biblioteca Comunitária Amigos da Leitura foi aprovado.

– Eba! Que alívio!

– Foi realmente um alívio, porque agora com dinheiro as coisas iriam ficar mais fáceis. De somente Fábio trabalhando na biblioteca pôde-se juntar mais pessoas e trazer mais atividades. A equipe era composta por Diógenes (administração), Jessica (catalogação e mediações) e Diego (administração e acervo). Foi alugado o espaço Clube de Gafieira Onze Belmonte, que era um clube de futebol. Este espaço aqui que estamos sentados e estou te contando esta história.

– Nossa! Aqui já foi uma gafieira?

– Isso! Apesar de ser um espaço de divertimento para a comunidade, a gafieira não era muito bem falada pelos vizinhos, pois além do barulho que acontecia durante o dia e noite, atrapalhando o cotidiano de quem morava no entorno, às vezes acontecia de ter muita violência, e houve o assassinato de uma pessoa dentro do espaço. Aproveitando que a gafieira fechou, Fábio perguntou para a comunidade o que achavam do espaço se tornar uma biblioteca… Imediatamente a comunidade abraçou a ideia e foi assim que hoje aqui é a nossa biblioteca.

– A mobilização foi tão grande que várias pessoas queriam ajudar a organizar o espaço, pois era um salão enorme, com muito lixo, garrafas e banheiro inutilizável. A comunidade se juntou para limpar e deixar o espaço digno para receber uma biblioteca. As crianças e adolescentes ficaram com outras tarefas mais leves, como ajudar a montar as estantes e organizar os livros. Depois de tudo organizado, tudo mudou, começamos a realizar atividades fora do espaço da biblioteca, para várias pessoas conhecerem que no Alto José Bonifácio havia uma biblioteca viva, ativa, com um bom acervo, e que todos poderiam utilizá-la para leituras e ter livros emprestados.

– Tia Selma, ouvindo sua história percebi que seu nome não apareceu no início. Como a senhora conheceu a nossa biblioteca?

– Então, não estava no início da construção da ideia, mas a história que te conto agora eu já ouvi do próprio Fábio e dos moradores da comunidade. Mesmo não estando aqui desde o início, já trabalhava com educação e integrava a Releitura, pois fui mediadora de histórias de outras bibliotecas que integravam ou ainda integram a rede. Minha primeira biblioteca foi a Biblioteca do Lar MeiMei, em Olinda. De lá, fui ser mediadora de leitura na Biblioteca Comunitária os Bravistas-Shekiná, em Olinda. Depois fui para mais distante, a Biblioteca Comunitária Simón Bolívar, em Abreu e Lima. Até que um dia consegui me instalar definitivamente aqui.

– Nossa, tia Selma, a senhora conheceu muitas bibliotecas, NE? Meu sonho é conhecer mais bibliotecas, assim como a senhora.

– Conheci muitas, por isso amo tudo isso que faço.

– Eu amo o que a senhora faz e amo muito a nossa biblioteca. Amo estar aqui no meio dos livros, com todas as atividades.

– Pois é, que bom saber disso, pois sempre estamos criando ações diversas para que cada vez vocês se sintam parte de toda a história que contei. Fazemos contações de histórias, mediações de leituras, Semana do Conto, rodas de conversas com as mães e mulheres, que é o Papo de Mulher.

– Ah! Do Papo de Mulher minha mãe participa. No dia da atividade ela fica muito feliz por compartilhar histórias e vivências com outras mulheres da comunidade.

– E você, o que mais gosta?

– Ah! Tia Selma, posso dizer que gosto de tudo. Mas se fosse escolher uma, amo as mediações de histórias. Fico muito feliz quando vejo a senhora abrindo o livro e nos trazendo novas histórias. Tia Selma, bem que a senhora disse que tio Fábio sempre quis despertar sonhos e criatividade, junto com os esportes. Participo de tudo e, realmente, depois do que a senhora me contou, percebi o quanto esta biblioteca foi e é importante para mim.

– Fico muito feliz de trazer todos esses sentimentos e, quem sabe, um dia não me substitua aqui no espaço para mediações de leitura?

– Sério que um dia vou poder contar histórias para outras crianças? Que vou ser igual à senhora e tio Fábio?

– Um dia não. Já pode ser. Por que você não começa contando para as outras crianças esta história da nossa biblioteca?

– Que massa! Vou sim, vou espalhar a história para todo mundo.

Autor:
Rafael Andrade, Licenciado em Letras, gestor e mediador de leitura da Biblioteca Popular do Coque. Articulador na Releitura-PE. Formador na área de Literatura infantil e juvenil, especialmente na relação inter-semiótica.

    Dados Gerais

  • Cidade e Estado: Recife-PE
  • Endereço: Rua Alto da Conquista, 303 – Alto José Bonifácio
  • Telefone(s): (81) 3262.2220
  • Email: bibliotecaamigosdaleitura@gmail.com
  • Links: https://www.facebook.com/biblioamigosdaleitura/ ?>
  • Instituição/Organização vinculada: ACESA - Associação Cultural Esportiva Social Amigos
  • Número de livros de literatura: 3280
  • Número anual de empréstimos de livros: 1422
  • Principais atividades de mediação de leitura: Mediações de leitura, Semana do Conto, Papo de Mulher, Contos de Terror.

    Contexto da Biblioteca

  • Território no qual a biblioteca está localizada:A Biblioteca Comunitária Amigos da Leitura está localizada no bairro do Alto José Bonifácio, na cidade do Recife, entre a zona norte e leste, no meio de várias outras comunidades periféricas, o que amplia ainda mais seu potencial de transformação social e cultural.
  • Fundação da biblioteca: 2005
  • Identidade da biblioteca: A biblioteca está localizada num antigo espaço de gafieira, bastante conhecido na comunidade devido às grandes festas que ocorriam no local. Mas devido às brigas, violências e perturbação sonora do espaço, acabou fechando, a pedido da vizinhança. Hoje, mantida e desejada pela comunidade, a biblioteca é espaço de promoção cultural e da leitura literária, trazendo bem-estar e utilidade pública para a comunidade. O espaço ainda promove ações esportivas e culturais, aliando a literatura a movimentos corporais e esportivos.
  • Enraizamento comunitário: A biblioteca promove atividades de enraizamento comunitário por meio de ações nas escolas, e atividades literárias que fazem parte da programação, como a Semana do Conto, Alfabetização de Idosos, Contação de Histórias, Mala de Leitura, mediação de leitura, Papo de Mulher.
  • Impactos sociais: A biblioteca é espaço de promoção cultural e da leitura literária, trazendo bem-estar, informações de utilidade pública, atuando na formação de leitores da comunidade. Uma ação que tem bastante impacto social é o Papo de Mulher, que busca o diálogo com esse público e já faz parte da rotina da biblioteca, para fortalecer os laços de compromissos entre o grupo envolvido. Os encontros são momentos de escuta, autocuidado, troca de experiências e de conversas dedicado só para mulheres.

    Personagem da Biblioteca

    A História de A.T.

    A sensação persistente de tristeza, a perda de interesse em atividades do dia a dia, o “mundo visto sem cores”, a baixa autoestima e pensamentos tóxicos eram sintomas da depressão que acompanhavam A.T., que até tentou colocar um ponto final em sua própria história algumas vezes.

    Mas A.T. descobriu na Biblioteca Comunitária Amigos da Leitura, localizada em sua vizinhança, elemento fundamental para auxiliá-lo em sua melhora, a leitura dos livros. Uma atividade prazerosa que possibilitou sonhar por meio do mundo da literatura. A.T. faz questão de relatar como os livros literários os ajudaram em sua jornada, e que hoje, mesmo não morando tão perto da biblioteca, pois agora vive em outra cidade, faz questão de visitá-la para pegar livros emprestados.

    A história de A.T. mostra a importância da literatura na vida das pessoas e em sua transformação. Ela pode caminhar junto a um tratamento medicamentoso e psicoterápico para conviver com a depressão. Quando o tratamento é feito de forma adequada, a literatura pode colocar “cores no mundo”.